sábado, 24 de maio de 2014

A Igreja II: A missão!

Enfim a continuação de A Igreja.

Sete perguntas sobre “Missões”[1]:[i]

Introdução:
Em 1996, eu estava do outro lado. Eu tinha apenas 16 anos e era o ouvinte, lá em Brasília, num acampamento para jovens, em que o preletor, rev. João Batista (então reitor do SETECEB - Seminário Teológico Cristão Evangélico do Brasil), falou claramente sobre o engajamento no projeto de Deus para o mundo, um chamado ao serviço. Naquela ocasião eu entendi que meu lugar era no sagrado ministério. Hoje, quase 20 anos depois estou aqui em Ariquemes-RO, e pela primeira vez vou palestrar aos jovens sobre Missões. Como eu estou me formando em administração gostaria de tratar desse tema, a partir da aplicação da ferramenta de gestão de projetos 5W2H (What, why, who, when, where, how, how much? – O que, por que, quem, quando, onde, como e quanto?). Utilizando esse modelo, responderei estas sete perguntas sobre Missões, no fim, espero que você esteja mais consciente desse assunto e disposto a participar desse projeto. 

Primeira: o que é “Missões”?
De acordo com o dicionário “Missão”, do latim missio(onis), envio: Ato de enviar ou de ser enviado; encargo, incumbência, desempenho de um dever; ou seja “Missões” é realizar uma tarefa. É assim no caso das Missões Cristãs. É realizar uma tarefa, um trabalho. Entretanto, é aí que o conceito em si apresenta um problema: o termo não aparece no Texto Sagrado[2]. O Conselho Mundial de Igrejas, reunido em 1967, definiu “Missões” como “promover a proclamação do evangelho de Jesus para o mundo todo, a fim de que todos os homens creiam nele e sejam salvos”. Outro conceito circunstante é que a Missão da Igreja é um derivativo da Mission Dei, onde Deus, o Pai, enviou o Seu Filho, (Jo 1;1-5 e 1;14) e ambos enviaram o Espírito Santo para a Igreja (Jo 14;16). Assim também a Igreja é enviada pelo Deus Trino para cumprir – ou repetir; guardada as devidas proporções[3] – o intendo divino de salvar a humanidade.
No senso comum cristão, “Missões” são iniciativas religiosas que difundem os princípios do Cristianismo entre povos não-cristãos; têm a ver com a  organização dos trabalhos que compõem e auxiliam o evangelismo; é a imitação do ministério de Jesus Cristo, ou seja, literalmente falar do Reino dos Céus; cumprir a Grande Comissão, o “ide” de Mt 28;19, pregar o Evangelho pelo mundo.

Segunda: por que fazer “Missões”?
Em Mt 28;18, um verso antes do famoso “Ide!”, Jesus afirma ter toda autoridade possível, tanto celestial como terrena; o poder é dele, ele é o Senhor. E é só depois de dizer isso que vem o sonoro “ide”.
Há, neste texto, muito mais do que uma simples sequência de informações. Há um “portanto” no meio dos termos “ide” e “fazei”, ligando-os de modo inquestionável a autoridade declarada anteriormente. Em outras palavras, devemos fazer “Missões” porque Jesus, a Autoridade, mandou. É na obediência a Cristo, que a Igreja avança! Não tem tanto a ver com amar almas perdidas; ou com encher igrejas! Antes, é uma questão de submissão ao Senhor Jesus. Mas lembre-se: Aquele que tem os seus mandamentos e os guarda, esse é o que o ama; e aquele que o ama será amado pelo Pai, e ele, Jesus, também o amará e se manifestará a ele (Jo 14;21),  ou seja, fazer "Missões" é uma questão de amor a Deus!

Terceira: Quem faz “Missões”?
Amar a Deus, é especialmente importante para responder esta pergunta, também! Você ama a Jesus Cristo? Ele é o seu Senhor? Você o obedece? “Missões” são para todos os que amam a Jesus, reconhecendo o seu senhorio e por isso buscam obedecer aos seus mandamentos. Mas há um outro detalhe: no verso 20 desse mesmo capítulo do Evangelho segundo Mateus, Jesus disse que estaria conosco nessa jornada. Assim Jesus é tanto o motivador (quem manda) das Missões, quanto o realizador desta tarefa em nós. Em outras palavras, faz “Missões” quem tem intimidade com Deus. Jesus em nós, isso é, o Espírito Santo, nos fará ir e fazer discípulos, naturalmente. Se é que, de fato, o Espírito Santo habita em nós.

Quarta: quando fazer “Missões”?
Você percebeu que Jesus disse que estaria conosco até a consumação dos séculos? Em Jo 4;35 ele falou da iminente hora da colheita! Em Hebreus, o autor alerta para a conversão no tempo presente e para o arrependimento proposto agora. E não se esqueça, pesa sobre cada um de nós o alerta: como escaparemos nós se negligenciarmos tão grande salvação? Então, podemos concluir que o tempo para "Missões" é o "agora" e até chegar o fim, a consumação dos séculos.

Quinta, onde fazer “Missões”?
Em At 1;8 Jesus também comissionando os discípulos diz que eles receberiam poder do Espírito Santo para serem testemunhas dele, tanto em Jerusalém como em toda a Judéia e Samaria e até aos confins da terra. Fazer "Missões" aqui no Brasil é estar nos confins da terra[4], e se nós estamos nos confins da terra, ficar por aqui, é cumprir o "Ide", e pronto!? Não! O texto não diz: primeiro deve-se fazer Missões em Jerusalém e depois na Judéia e então nos outros lugares. Jesus ordena que "Missões" sejam feitas lá no oriente médio tanto quanto em outros lugares da terra. Onde você está, ou noutro lugar que você possa (ou deva) ir, é o lugar onde você precisa anunciar o Evangelho, fazer “Missões”. Sem esquecer, claro, que Missões devem ser feitas em diversos lugares, ao mesmo tempo. Assim, ore e contribua, também, sempre!

Sexta: como fazer “Missões”?
Existe uma máxima bastante significativa sobre como qualquer pessoa pode fazer "Missões". Diz assim: você pode fazer "Missões" indo, orando ou contribuindo, e é bem verdade. Entretanto, não há a necessidade de ir para fora do Brasil para fazer missões; nem mesmo de deixar seu emprego, ou largar a faculdade. "Missões" são também transculturais, mas não são só transculturais! Assuma sua responsabilidade como um missionário, assuma sua missão. Eu desafio você a orar por "Missões", mas não simplesmente pelos missionários na Janela 10/40, ore para que Deus te direcione e te dê oportunidades de ser um missionário! Contribuir é a forma mais fácil de fazer “Missões”, o simples fato de você contribuir com o dízimo e ofertas na igreja em que você congrega, já faz de você um contribuinte de "Missões". Mas, além disso, o texto de Mt 28;18 a 20 esclarece que as "Missões" são fazer discípulos, ensinando-os a obedecer tudo o que Jesus ensinou – ele ensinou, literalmente, toda a Bíblia. Ser um discipulador ou dar aula na EBD da sua igreja, mesmo falar sobre assuntos bíblicos em rodas de amigos ou pregar formalmente em um culto, é, em algum sentido, fazer “Missões”. Até a disciplina na Igreja é ser "missional", afinal, Deus ama e corrige seus filhos.
Junto à isto, e em especial, está a ordem do Batismo, presente, inexoravelmente, na Grande Comissão, deixando claro que “Missões” não pode ser um trabalho destacado  de uma igreja local. Como cumprir essa parte da missão se não há uma comunidade local para inserir esses novos discípulos? Se não houver um lugar onde eles possam continuar a crescer e exercitar a sua fé, fazendo outros discípulos também crescerem, como cumprirão, cada um, a sua própria missão? Portanto, abrir  igrejas, onde ainda não existem, é fazer “Missões”, sem dúvida.

Sétima: qual o custo de “Missões”?
Em Hb 11;35 a 40, diz: ...alguns foram torturados, não aceitando seu resgate, para obterem superior ressurreição; outros, por sua vez, passaram pela prova de escárnios e açoites, sim, até de algemas e prisões. Foram apedrejados, provados, serrados pelo meio, mortos ao fio da espada; andaram peregrinos, vestidos de peles de ovelhas e de cabras, necessitados, afligidos, maltratados (homens dos quais o mundo não era digno), errantes pelos desertos, pelos montes, pelas covas, pelos antros da terra. Jesus disse também que aquele que não tomar a sua cruz e não segui-lo ou não abandonar (se necessário) seus familiares[5] e ou não gerar inimizades[6], não é digno de ser discípulo dele, assim não podendo (e não querendo) fazer “Missões”.
Sabemos que o mundo perseguirá aqueles que andam com Cristo e os odiará do mesmo modo que odiaram a Jesus! Afinal, os discípulos do Mestre são como ovelhas enviadas para o meio de lobos! Duro esse discurso?! Mas o oposto, não fazer “Missões”, é pior! Porquanto, quem quiser salvar a sua vida perdê-la-á (Mt 16;25), não temais os que matam o corpo e não podem matar a alma; temei, antes, aquele que pode fazer perecer no inferno tanto a alma como o corpo (Mt 10;28).

Para terminar:
"Missões" nasce no coração de Deus, literalmente, significa divulgar o Evangelho; compartilhar a Fé, ensinando sobre Deus, a Bíblia e a salvação somente através de Cristo. É falar da Cruz de Jesus, contar suas histórias e divulgar seus ensinos. Para tanto temos que abrir mais igrejas por todo o mundo e incluir nelas novos convertidos. E com oração e súplicas, por amor a Cristo, investir nosso tempo, trabalho e dinheiro nesse projeto que descende do alto.
 A Igreja sempre entendeu a sua missão, “o ide e fazei” de Mt 28;19. Foram esses os Atos dos Apóstolos, toda a história eclesiástica demonstra isso, e, até muito recentemente, foi exatamente assim que a Igreja agiu, o que é confirmado até pelas missões feitas, inclusive aqui no Brasil[7], poucos anos depois da Reforma Protestante do séc. XVI.



[1] O termo missão está no plural, missões, mas é tratado como a ação fazer missões, assim, no texto assumirei o singular, para tanto usarei as aspas.
[2] As 4 ocorrências do termo ‘missão’ na Bíblia ARA, a Jo 2;14 e 20, At 12;25, 1Tm 2;15, não estão relacionados a ideia do artigo.
[3] Cristo com o único sacrifício expiatório necessário e a Igreja como agente proclamador dessa verdade.
[4] Atos 1; 8 foi dito no oriente médio, Jerusalém, daí quanto mais distante de lá, mais no fim do mundo estamos.
[5] A ideia é abdicar da estabilidade, conforto e segurança da casa dos pais, e não abandonar ou se isentar de responsabilidades.
[6] Por causa de Cristo e de sua Palavra.
[7] Em 7 de Março de 1557, chegam ao Brasil, na então colônia francesa, na Baía de Guanabara, os primeiros missionários calvinistas (huguenotes-franceses da Igreja Reformada Francesa) enviados por João Calvino. O projeto fracassou e parte desses protestantes foi morta pelos colonos portugueses. A partir 1630, a Igreja Reformada Holandesa fundou cerca 20 congregações no Nordeste, mais de 50 pastores além de pregadores auxiliares e outros oficiais trabalharam nesse projeto que batizou índios e pretendia traduzir a Bíblia para o tupi e para o português, além de ordenar pastores indígenas e lusitanos. 20 anos depois a coroa portuguesa organizou um projeto militar de expulsão dos holandeses e retomou o nordeste brasileiro.



[i] Baseado no esboço e nas transcrições da palestra ministrada na Primeira Igreja Presbiteriana de Ariquemes – RO, dia 18 de maio de 2014.

Agradeço a Luciana Braga, minha irmã que sempre me ajuda com as (inúmeras) correções dos textos que publico no blog, ou nos trabalhos escolares desde o jardim de infância até os das faculdades. Ao Neto (Francisco) que deu grande contribuição na formatação (curta, direta e sem perdas) desse artigo. Ao David Portela que me enviou material-fonte para a composição do esboço da palestra. E para todos que de um modo ou outro colaboraram me indicando livros, artigos e etc. para a preparação e finalização do estudo. Finalmente a turma da UMP que gentilmente me convidou para assumir o púlpito no intercâmbio, entre as UMPs do PPVH e do PCRO, me dando assim um empurrão para tratar dessa matéria tão cara para mim.